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Planos de Saúde e o ROL da ANS
O Direito à saúde é uma questão muito sensível em nossa sociedade.
Recentemente passamos por uma grave crise mundial decorrente da pandemia do Covid-19.
Ficou claro para todos, mundialmente, que a saúde é nosso bem maior e, por isso, ela deve ser amparada pelo Estado e garantias devem ser estabelecidas para a parte mais frágil na saúde, ou seja, o paciente, o consumidor.
Mas, paradoxalmente, não foi isso que visualizamos em recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que definiu como taxativo o Rol da ANS.
Mas, o que é esse ROL da ANS?
Explico: O Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estabelece a cobertura assistencial obrigatória a ser garantida nos planos privados de assistência à saúde, respeitando-se as segmentações assistenciais contratadas. Nada mais é do que uma lista de exames e procedimentos que são autorizados pelos Planos de Saúde, obrigando as operadoras a cobrir tais exames, tratamentos e procedimentos.
Uma breve análise de contexto histórico:
Existia uma grande discussão, com decisões antagônicas, em duas Turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a obrigatoriedade ou não dos Planos de Saúde cobrirem procedimentos exames e tratamentos que não estavam delimitados no Rol da ANS.
O STJ é composto por 6 Turmas de Ministros, sendo que apenas duas delas julgam questões de direito privado, no caso, a 3ª e 4ª Turmas.
A Terceira Turma entende que o Rol da ANS é meramente exemplificativo, ou seja, a relação de procedimentos que deveriam ser cobertos pelos Planos de Saúde, descritos no ROL da ANS são meramente exemplificativos e, com isso, poderiam ser aplicados outras técnicas e procedimentos ali não discriminados, preservando assim o interesse, a saúde e a integridade do paciente.
Segundo a jurisprudência daquela turma do STJ, o plano de saúde deve custear o tratamento de doença coberta pelo contrato, portanto, as operadoras não poderiam limitar a terapêutica a ser prescrita por profissional habilitado ao beneficiário para garantir sua saúde ou sua vida, esclarecendo, ainda, que tal ato não é obstado pela ausência de previsão no Rol de procedimentos da ANS.
Segundo entendimento daquela Terceira Turma, em que pese a existência de precedente da Quarta Turma entendendo ser legítima a recusa de cobertura com base no Rol de procedimentos mínimos da ANS, a Terceira Turma, no julgamento do Recurso Especial nº 1.846.108/SP, de relatoria da Ministra NANCY ANDRIGHI, julgado aos 2/2/2021, reafirmou sua jurisprudência no sentido do caráter exemplificativo do referido Rol de procedimentos. Precedentes da Terceira Turma.
Era nítida a jurisprudência no sentido de que, em regra, sendo indevida a negativa de cobertura pela operadora do plano de saúde do tratamento médico pleiteado, ficava caracterizado o ilícito civil ensejador da reparação por danos morais.
Noutro pano, a Quarta Turma já analisava a questão por outro ângulo. Esta turma, por exemplo, ao analisar o Recurso Especial 1.733.013-PR (2018/0074061-5), decisão de 10/12/2019. a 4ª turma do STJ, em julgamento de Recurso de beneficiário de plano de saúde contra a UNIMED LONDRINA, negou o pedido da consumidora para obrigar o plano de saúde a custear procedimento que não está previsto pela ANS. A decisão se deu em julgamento ocorrido em 10/12/2019, em caso de relatoria do ministro Luís Felipe Salomão. Em recurso contra acórdão do TJ/PR, a beneficiária alegou, dentre outros, que o Rol da ANS é apenas exemplificativo, e o contrato não faz nenhuma menção de exclusão expressa do procedimento, devendo prevalecer no caso as previsões do CDC. O relator consignou que o direito à saúde é direito humano fundamental, porém, destacou que no tocante à saúde suplementar, devem ser observadas as Leis nº 9.656/1998 e a Lei n. 9.961/2000.
Entendimento atual do STJ – ROL É TAXATIVO:
Pois bem, feita essa análise da divergência que ocorria entre aquelas duas Turmas do STJ, passamos para o que está prevalecendo naquela Superior Corte de Justiça.
Em recentíssimo julgamento que aconteceu em 08 de Junho deste ano de 2022, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser taxativo, em regra, o Rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), não estando as operadoras de saúde obrigadas a cobrirem tratamentos não previstos na lista. Contudo, o colegiado fixou parâmetros para que, em situações excepcionais, os planos custeiem procedimentos não previstos na lista, a exemplo de terapias com recomendação médica, sem substituto terapêutico no Rol, e que tenham comprovação de órgãos técnicos e aprovação de instituições que regulam o setor.
Por maioria de votos, a seção definiu as seguintes teses:
Novo Projeto de Lei é aprovado pelo Senado em 29 de Agosto de 2022
Em junho, como mencionado acima, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os planos só estariam obrigados a financiar exames e tratamentos listados no Rol da ANS. A decisão provocou a mobilização de associações de pacientes usuários de planos de saúde, cujos tratamentos seriam interrompidos em razão da adoção do Rol taxativo.
Em resposta à terrível decisão do STJ que afeta drasticamente os usuários de Planos de Saúde, a Câmara dos Deputados, aprovou em regime de urgência um Projeto de Lei (PL 2.033/2022) que possui como objeto a modificação da Lei dos Planos de Saúde para estabelecer hipóteses de cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão incluídos no ROL da ANS. O Projeto aprovado pela Câmara foi remetido ao Senado Federal e também foi aprovado por lá, sem mudanças, com apoio unânime do Senado. O referido projeto seguiu para sanção Presidencial.
O projeto de lei, apresentado em reação à decisão do STJ, determina que o Rol da ANS será apenas a “referência básica” para a cobertura dos planos de saúde. Um tratamento fora da lista deverá ser aceito desde que cumpra uma das seguintes condições:
É importante destacar que esta aprovação representa um marco histórico em vitória à população que depende de um plano de Saúde. Há, no Congresso Nacional, um lobby muito grande em favor das operadoras de planos de saúde no Brasil e a aprovação deste Projeto de Lei foi uma vitória imensurável em favor da parte mais fraca nesta relação de consumo que é o usuário consumidor.
Com esta Lei, quando aprovada, não haverá mais discussões em âmbito judicial no que se refere à possibilidade ou não de cobertura. É claro que as operadoras irão brigar na justiça para que não sejam obrigadas a cobrir os procedimentos não elencados no Rol, mas, nesta briga, quem vencerá será o usuário.
Desta maneira, o debate sobre o tema ainda está longe de acabar. A decisão do STJ sobre a taxatividade do Rol da ANS é só mais um capítulo nesta discussão, que ainda continuará no campo jurídico, com o inevitável pronunciamento do STF sobre a matéria e político, com a sanção ou possível veto do PL 2033/2022 pelo Presidente da República.
Referências[1]
Leonardo Fortaleza é advogado, inscrito na OAB/GO sob o n.º 30.715, é sócio do escritório Fortaleza Advocacia, membro das Comissões de Direito do Consumidor e Direito de Família e Sucessões da Subseção de Anápolis, MBA em Gestão Financeira, Análise de Investimentos e Tributação, MBA em Holding e Planejamento Societário.
[1] Referências:
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